Biografia
José Saramago nasceu na vila de Azinhaga, no concelho da Golegã, de uma família de pais e avós agricultores. A sua vida é passada em grande parte em Lisboa, para onde a família se muda em 1924
– era um menino de apenas dois anos de idade. Dificuldades económicas
impedem-no de entrar na universidade. Demonstra desde cedo interesse
pelos estudos e pela cultura, sendo que esta curiosidade perante o Mundo
o acompanhou até à morte. Formou-se numa escola técnica. O seu primeiro
emprego foi de serralheiro mecânico. Fascinado pelos livros, visitava, à
noite, com grande frequência, a Biblioteca Municipal Central — Palácio Galveias.
Aos 25 anos, publica o primeiro romance Terra do Pecado (1947), no mesmo ano de nascimento da sua filha, Violante, fruto do primeiro casamento com Ilda Reis – com quem se casou em 1944 e com quem permaneceu até 1970. Nessa época, Saramago era funcionário público. Em 1988, casar-se-ia com a jornalista e tradutora espanhola María del Pilar del Río Sánchez, que conheceu em 1986 e ao lado da qual viveu até à morte. Em 1955 e para aumentar os rendimentos, começou a fazer traduções de Hegel, Tolstoi e Baudelaire, entre outros.
Depois de Terra do Pecado, Saramago apresentou ao seu editor o livro Clarabóia
que, depois de rejeitado, permanece inédito até à data de hoje.
Persiste, contudo, nos esforços literários e, dezanove anos depois,
funcionário, então, da Editorial Estudos Cor, troca a prosa pela poesia, lançando Os Poemas Possíveis. Num espaço de cinco anos, publica, sem alarde, mais dois livros de poesia: Provavelmente Alegria (1970) e O Ano de 1993 (1975). É quando troca também de emprego, abandonando a Estudos Cor para trabalhar no Diário de Notícias (DN) e, depois, no Diário de Lisboa.
Em 1975, retorna ao DN como Director-Adjunto, onde permanece por dez
meses, até 25 de Novembro do mesmo ano, quando os militares portugueses
intervêm na publicação (reagindo ao que consideravam os excessos da Revolução dos Cravos)
demitindo vários funcionários. Demitido, Saramago resolve dedicar-se
apenas à literatura, substituindo de vez o jornalista pelo ficcionista: "(…)
Estava à espera de que as pedras do puzzle do destino – supondo-se que
haja destino, não creio que haja – se organizassem. É preciso que cada
um de nós ponha a sua própria pedra, e a que eu pus foi esta: "Não vou
procurar trabalho", disse Saramago em entrevista à revista Playboy, em 1995.
Da experiência vivida nos jornais, restaram quatro crónicas: Deste Mundo e do Outro, 1971, A Bagagem do Viajante, 1973, As Opiniões que o DL Teve, 1974 e Os Apontamentos, 1976. Mas não são as crónicas, nem os contos, nem o teatro os responsáveis por fazer de Saramago um dos autores portugueses de maior destaque - esta missão está reservada aos seus romances, género a que retorna em 1977.
Três décadas depois de publicado Terra do Pecado, Saramago retornou ao mundo da prosa ficcional com Manual de Pintura e Caligrafia. Mas ainda não foi aí que o autor definiu o seu estilo. As marcas características do estilo Saramaguiano só apareceriam com Levantado do Chão (1980), livro no qual o autor retrata a vida de privações da população pobre do Alentejo.
Dois anos depois de Levantado do Chão (1982), surge o romance Memorial do Convento,
livro que conquista definitivamente a atenção de leitores e críticos.
Nele, Saramago misturou factos reais com personagens inventados: o rei D. João V e Bartolomeu de Gusmão,
com a misteriosa Blimunda e o operário Baltazar, por exemplo. O
contraste entre a opulenta aristocracia ociosa e o povo trabalhador e
construtor da história servem de metáfora à medida da luta de classes
marxista. A crítica brutal a uma Igreja ao serviço dos opressores inicia
a exposição de uma tentativa de destruição do fenómeno religioso como
devaneio humano construtor de guerras.
De 1980 a 1991, o autor trouxe a lume mais quatro romances que
remetem a factos da realidade material, problematizando a interpretação
da "história" oficial: O Ano da Morte de Ricardo Reis (1984) - sobre as andanças do heterónimo de Fernando Pessoa por Lisboa; A Jangada de Pedra
(1986) - em que se questiona o papel Ibérico na então CEE através da
metáfora da Península Ibérica soltando-se da Europa e encontrando o seu
lugar entre a velha Europa e a nova América; História do Cerco de Lisboa (1989) - onde um revisor é tentado a introduzir um "não" no texto histórico que corrige, mudando-lhe o sentido; e O Evangelho Segundo Jesus Cristo
(1991) - onde Saramago reescreve o livro sagrado sob a óptica de um
Cristo que não é Deus e se revolta contra o seu destino e onde, a fundo,
questiona o lugar de Deus, do cristianismo, do sofrimento e da morte.
Nos anos seguintes, entre 1995 e 2005, Saramago publicou mais seis
romances, dando início a uma nova fase em que os enredos não se
desenrolam mais em locais ou épocas determinados e personagens dos anais
da história se ausentam: Ensaio Sobre a Cegueira (1995); Todos os Nomes (1997); A Caverna (2001); O Homem Duplicado (2002); Ensaio Sobre a Lucidez (2004); e As Intermitências da Morte
(2005). Nessa fase, Saramago penetrou de maneira mais investigadora os
caminhos da sociedade contemporânea, questionando a sociedade
capitalista e o papel da existência humana condenada à morte.
A ida para Lanzarote conta mais sobre o escritor do que deixa
transparecer a justificativa corrente (a medida censória portuguesa).
Com o gesto de afastamento rumo à ilha mais oriental das Canárias,
Saramago não apenas protesta ante o cerceamento, como finca raízes num
local de geografia inóspita (trata-se de uma ilha vulcânica, com pouca
vegetação e nenhuma fonte de água potável). A decisão tem um carácter
revelador, tanto mais se se levar em conta que, neste caso, "mais
oriental" significa dizer mais próximo de Portugal e do continente
europeu.
Mesmo em dias de hegemonia do pensamento pró-mercado, Saramago guarda um olhar abrigado numa ilha europeia mais próxima da África
que do velho centro da civilização capitalista. Sempre atento às
injustiças da era moderna, vigilante das mais diversas causas sociais,
Saramago não se cansava de investir, usando a arma que lhe coube usar, a
palavra. "Aqui na Terra a fome continua, / A miséria, o luto, e outra vez a fome.", diz o eu lírico do poema saramaguiano "Fala do Velho do Restelo ao Astronauta" (do livro Os Poemas Possíveis, editado em 1966).
Saramago faleceu no dia 18 de Junho de 2010, aos 87 anos de idade, na sua casa em Lanzarote onde residia com a mulher Pilar del Rio, vítima de leucemia crónica. O escritor estava doente havia algum tempo e o seu estado de saúde
agravou-se na sua última semana de vida. O seu funeral teve honras de
Estado, tendo o seu corpo sido cremado no Cemitério do Alto de São João,
em Lisboa. As cinzas do escritor, foram depositadas aos pés de uma oliveira, em Lisboa em 18 de junho de 2011.
Obra
José Saramago foi conhecido por utilizar um estilo oral, coevo dos
contos de tradição oral populares em que a vivacidade da comunicação é
mais importante do que a correcção de uma linguagem escrita. Todas as
características de uma linguagem oral, predominantemente usada na
oratória, na dialéctica, na retórica e que servem sobremaneira o seu
estilo interventivo e persuasivo estão presentes. Assim, utiliza frases e períodos compridos, usando a pontuação de uma maneira não convencional; Os diálogos das personagens são inseridos nos próprios parágrafos que os antecedem, de forma que não existem travessões nos seus livros.
Este tipo de marcação das falas propicia uma forte sensação de fluxo de
consciência, a ponto do leitor chegar a confundir-se se um certo
diálogo foi real ou apenas um pensamento. Muitas das suas frases (i.e.
orações) ocupam mais de uma página,
usando vírgulas onde a maioria dos escritores usaria pontos finais. Da
mesma forma, muitos dos seus parágrafos ocupariam capítulos inteiros de
outros autores. Por isso, se o leitor se habituar ao o seu estilo, a sua
leitura é muito agradável, pois o seu ritmo está muito próximo da eloquência oral do Povo Português.
Estas características tornam o estilo de Saramago único na literatura
contemporânea, sendo considerado por muitos críticos um mestre no
tratamento da língua portuguesa. Em 2003, o crítico norte-americano Harold Bloom, no seu livro Genius: A Mosaic of One Hundred Exemplary Creative Minds
("Génio: Um Mosaico de Cem Exemplares Mentes Criativas"), considerou
José Saramago "o mais talentoso romancista vivo nos dias de hoje"
(tradução livre de the most gifted novelist alive in the world today),
referindo-se a ele como "o Mestre". Declarou ainda que Saramago é "um
dos últimos titãs de um género literário que se está a desvanecer".
Obras publicadas
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Prémios
Entre as premiações destacam-se o Prémio Camões (1995) - distinção
máxima oferecida aos escritores de língua portuguesa, e o o Nobel de
Literatura (1998) - o primeiro concedido a um escritor de língua
portuguesa.
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